É joia ou jornal?
Já pensou naquelas resmas de jornais que tendemos a acumular, mas que acabam invariavelmente no lixo? Há uma portuguesa que viu nesse desperdício um recurso e que, por gostar do diferente e por via da necessidade, criou a Sigues, uma interessante inovação na área dos acessórios femininos.
A marca já foi premiada pelo programa Connect to Sucess, da Embaixada dos Estados Unidos da América, e continua na senda de estar cada vez em mais locais de venda.
E não há que ter medo de sair à rua com Sigues num dia de chuva, porque a Sílvia Rodrigues, a empreendedora por trás da marca, pensou em tudo e todos os produtos são impermeáveis.
Damos voz à Sílvia Rodrigues, para nos contar tudo sobre esta inovação.
G&L: A Sigues tem aquela enorme mais-valia de transformar o aparente desperdício em valor, neste caso o papel de jornal. Como chegou até esta ideia e como fez dela o seu negócio?
Sílvia Rodrigues (SR): A Sigues começou com pequenas peças feitas com papel de jornal, para eu poder usar. Sempre me quis diferenciar das outras pessoas e queria usar algo diferente. Comecei a fazer experiências com papel de jornal e surgiram as primeiras peças. As pessoas começaram a ver, começaram a gostar, amigo chama amigo, e o negócio começa a crescer, na altura ainda como um hobby. Sou licenciada em Design e dei aulas durante sete anos.
A certa altura, fiquei desempregada e pensei tornar aquilo que até essa altura era um hobby, numa profissão, num negócio.
A ideia do negócio surgiu com o New Beginning For Portugal e aí foi a transição do hobby para a profissão a tempo inteiro.
G&L: A Sigues foi premiada pelo programa Connect to Sucess da Embaixada dos Estados Unidos da América, em 2014. Que importância teve este prémio para o desenvolvimento do negócio?
SR: O Connect to Sucess surgiu numa altura em que eu estava a dar os primeiros passos já com a Sigues a profissionalizar e foi fundamental para estruturar todo o negócio. Trabalhei diretamente com o ISCTE, uma das maiores Faculdades de Economia do país e com a Embaixada dos Estados Unidos da América em Portugal. Foram experiências muito enriquecedoras que me fizeram pensar em temas sobre os quais eu nunca tinha parado para pensar. Estamos a falar de finanças e de marketing. Estamos a falar também de desenvolvimento pessoal e de acreditar naquilo que estávamos a fazer. O programa deles inclui a associação com um MBA. Trabalhamos diretamente com alunos, neste caso do ISCTE – Faculdade de Economia. Mas também promovem workshops, nos quais recebemos formação gratuita sobre a área do empreendedorismo. E nesse ponto foi muito, muito positiva também a minha participação. Ganhei bastante, cresci bastante e todo o negócio ficou estruturado, para agora seguir o seu caminho e dar os próximos passos.
G&L: A sua experiência prévia em direção de pós-venda e projetos foi um sério input para o sucesso da estratégia da Sigues ou nem por isso? E no quê?
SR: Toda a minha experiência até a Sigues se afirmar como um negócio, foi importante. Na altura, era um hobby, mas desenvolvi muitos contactos, estive presente em muitas feiras e muitos eventos que também me trouxeram conhecimento e prestígio. No entanto, nessa altura, não tinha ideia de algumas coisas que eram necessárias, até porque a minha formação é na parte criativa, na parte artística.
Embora eu me tentasse dividir em várias áreas e tentasse assegurar tudo isso, nem sempre é fácil, porque nós somos bons numa área, mas, quando tentamos ir para outra área, podemos fazer, mas não fazemos tão bem como um profissional dessa área.
De facto, na altura, tinha muitas carências que precisavam de ser supridas. Portanto, foi positivo todo esse percurso que fiz antes da Sigues nascer e se afirmar. No entanto, há algumas ‘manhas’ que se criam nessa altura e depois é preciso desconstruir, quebrar aquilo que foi feito, partir tudo em pedaços e ver aquilo que se pode dali aproveitar para poder seguir no futuro.
G&L: Quais os principais desafios que se lhe foram deparando no processo de criação e crescimento da Sigues?
SR: Os principais desafios ainda hoje existem e vão existir sempre. Fazer jóias em papel de jornal é uma ideia inovadora. Nunca ninguém tinha feito nada semelhante. Eu sempre achei o papel de jornal bonito e, por isso, comecei a fazer as peças com papel de jornal. Um desafio diário para mim é levar quem me vê a dar valor àquilo que eu estou a fazer.
As pessoas nem sempre compreendem à primeira aquilo que eu faço. Tenho feito um trabalho de educar as pessoas nesse sentido e fazê-las entender que, sendo o papel de jornal um material acessível a todos nós que, diariamente, lemos as notícias e contactamos com esse material, podemos fazer jóias com ele, que é aquilo que eu faço.
Crio uma nova vida para o papel de jornal, que deixa de ter a função de informar as pessoas, passa por um processo de transformação e começa a ser uma obra de arte. A minha principal dificuldade foi criar esta nova ideia e implementá-la no hábito diário das pessoas, para que elas pudessem valorizar aquilo que eu faço com o papel de jornal. Não estamos a falar de ouro, nem prata, nem diamantes, estamos a falar de papel de jornal, um material que, em si, não tem qualquer valor. E dar valor a esse material também tem sido um trabalho que eu tenho feito.
Não é um trabalho fácil, mas é um trabalho possível e, neste momento, já tenho pessoas que acreditam em mim, acreditam naquilo que eu faço, dão valor àquilo que eu faço e me seguem para onde quer que eu vou, para adquirirem as peças.
G&L: Que lições aprendidas partilha com todos os que aspiram a apostar numa ideia e a criarem o seu próprio negócio?
SR: O lema da marca Sigues é amor. Sigues é seguir em frente, fazendo aquilo de que gostamos e fazê-lo com amor. Quando fiquei desempregada, decidi correr riscos, pegar num hobby e torná-lo numa profissão, fazendo aquilo de que eu gosto.
O que digo às pessoas é que façam. Se têm alguma coisa que gostam de fazer e se essa coisa lhes sai do coração, façam, não desistam, vão mais além.
Podem não consegui-lo já, mas continuem a trabalhar, continuem a traçar o caminho, porque um dia vão lá chegar. Mas também têm de acreditar naquilo que estão a fazer, porque a primeira pessoa que tem de acreditar naquilo que fazemos, a primeira pessoa a comprar a nossa ideia, somos nós próprios. Quando nós acreditamos, todas as pessoas em nosso redor vão começar a acreditar, mais tarde ou mais cedo. O meu conselho é que se mantenham firmes e convictos daquilo que estão a fazer e não desistam.
Há um lema que é: “Insiste, persiste, mas não desiste”. É isso o que devem fazer.
Sílvia Rodrigues é formada em Design de Comunicação, pela Universidade do Algarve, tendo seguido a carreira de docente de Artes Visuais. Iniciou-se na criação de joias em papel de jornal há nove anos, tendo criado a marca Sigues. Foi a primeira designer nesta área na Europa e uma das primeiras no mundo. Desde então tem sido convidada para promover o seu trabalho em eventos de moda e certames por todo o país. Em 2009, foi distinguida com o Prémio Inovação e em 2010, conquistou o prémio “artesanato contemporâneo”, no âmbito do Prémio Nacional de Artesanato. Em 2013 estreou-se nas exposições. Em 2014 foi distinguida com o Connect to Sucess MBA promovido pela Embaixada dos Estados Unidos da América em Portugal. Em 2015 venceu o prémio Empreendedorismo ANB FEST 2015, pelo A New Beggining for Portugal, e iniciou a primeira etapa da internacionalização da marca, estando presente em França. Atualmente a Sigues está em forte expansão, com vários pontos de venda em Portugal e na Europa o que a torna uma forte referência na inovação, criatividade e design na moda em Portugal.
Entrevista online em http://gerireliderar.com/e-joia-ou-jornal/